quarta-feira, maio 26, 2004

Ele, Rosto De Escritor

Ele escreve, libertando em pedaços de palavras,
como se a magia o cobrisse de paz.
Tráz no rosto uma pérola brilhante de água,
um lençol molhado pelas lágrimas do destino.
-
Ele chora, cheias e incêndios de saliva lacrimal,
vendo em todo o esplendor de um coração ensaguentado,
molhando a lingua com saltos de alturas longiquas
erguido ao cimo de cada pedra na montanha da vida.
-
Ele vive, respira a brutalidade de cada palavra,
de cada letra, de canta ponto e virgula, o tutano
de um olhar sombrio através da janela, partida
sentindo no ouvido o barulho de um avião solto no ar.
-
Ele sorri, fecha os olhos e sorri, pensa nela que não existe,
em tons de desatenção, vê-se a beijar um nada, beija-a
no ar perante ele, sem presença fisica do seu imaginário.
Abre os olhos e abraça-se em voltas de trocadilhos.
-
Ele pressente, arrepio em pele escaldada e grita vertiginosamente,
levanta-se e pontapeia a cadeira contra a parede, furiosamente
rasga a folha em que soprava todas aquelas forças de raiva.
Enche um copo com liquido alcóolico e embebeda-se.
-
Ele não vê, ou revê tudo em sentidos de embriagado, copo em cacos
lançado contra o armário que se opões à sua presença, e
reclama sózinho ao tempo que cai a noite atrás daquelas persianas já fechadas,
subindo a lua entre os muros de um exterior por ele desconhecido.
-
Ele fuma, não se lhe dava conta o nivel de alcool com vida na sua pessoa,
desfazia com suor aquela barra castanha que possuia, e libertava um sorriso
de gozo, dizendo atempadamente e em gemidos fogazes: "droga, vem a mim e corta-me".
Inspirando através de longos tempos, matou todo aquele conjuno de quimicos num cinzeiro.
-
Ele vomita, debruçado sobre o parapeito da janela agora aberta,
engasgando-se em cada soluço, a raiva perdida em forma de vómito.
Apoiado agora com ambos os cotovelos em cima daquela mesa velha em que escrevia,
ri-se lembrando-se de todas aquelas poesias que escrevia e rasgava.
-
Deita-se, o colchão já batia no fundo, e toda esta noite para comemorar,
para se lembrar que não conhecia nada em vão, conhecia um mundo,
conhecia o alcool, a droga e a sensação de escrever e rasgar,
mantendo em mente todos os conjuntos de palavras mutilados por suas mãos.
-
Via tudo isto em cada dia que abria as persianas do mundo,
olhava para a presença da morada em frente à minha, e
conseguia sentir o cheiro de toda aquela loucura de dia-a-dia,
de cada segundo intimo e possessivo que aquele escritor vivia.
-
-
fim
-
HUGO SOUSA

Sem comentários: